Eles não são números: o discurso jornalístico e a construção do memorial Inumeráveis
DOI :
https://doi.org/10.28998/2317-9945.202376.353-367Résumé
Este artigo apresenta uma análise de textos do projeto memorial Inumeráveis, que homenageia vítimas fatais da pandemia da Covid-19 no Brasil. Para isso, recorre à Análise do Discurso, observando dois movimentos de sentidos principais na construção dos obituários: os de negação e de negativização da morte. A discussão proposta inicia pelas condições de produção do discurso, entendidas aqui como a articulação entre o sócio-histórico, próprio do momento atual, e a produção dos textos do projeto, classificados como parte do gênero jornalístico obituário. A análise identifica a predominância de um discurso próprio da formação discursiva religiosa cristã, trabalhando metaforicamente a valorização da vida e a promessa de existência após a morte. Essa superfície encobre a lógica da necropolítica e o discurso de negação da morte, atravessado por elementos de uma formação ideológica de mercado, cuja noção de falecimento é entendida como o fracasso final dos sujeitos.
Palavras-chave: Inumeráveis. Subjetividade. Discurso